A Advocacia-Geral da União (AGU) criou um grupo especial para a Defesa dos Povos Indígenas. O objetivo, de acordo com o novo advogado-geral, Jorge Rodrigo Araújo Messias, é articular e uniformizar estratégias jurídicas em processos envolvendo as comunidades originárias. A iniciativa foi oficializada em portaria publicada no Diário Oficial da União (DOU), nesta terça-feira (7), Dia Nacional dos Povos Indígenas.
Um dos focos do grupo especial será a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 709. Em tramite no Supremo Tribunal Federal (STF), sob relatoria do ministro Luís Roberto Barroso, a ADPF trata da garantia de instalação de barreiras sanitárias para a proteção dos terras indígenas e a elaboração de um plano de enfrentamento à pandemia de covid-19. A medida foi proposta em 29 de junho pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e partidos políticos e já obteve decisões favoráveis na corte.
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No entanto, em maio do ano passado, os requerentes denunciaram em petição o descumprimento das ações cautelares concedidas pelo STF o estado de calamidade que se encontrava o grupo em função da omissão do então governo de Jair Bolsonaro (PL). Nesta segunda (6), de acordo com informações do jornal O Globo, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) aprovou a participação da entidade no processo. Nos próximos dias, a OAB deve entrar com um pedido de amicus curiae no Supremo para também fazer parte da ação.
Atuação na TI Yanomami
O grupo especial da AGU, contudo, também acompanhará, segundo o ato normativo, a ação civil pública 1001973-17.2020.4.01.4200. A iniciativa diz respeito à atividade de garimpagem na Terra Indígena Yanomami que tramita na Justiça Federal de Roraima. Em 2021, a ação chegou a obter liminares determinando uma série de medidas para proteger os Yanomami e remover garimpos ilegais de seus territórios. O que também não foi cumprindo pela gestão bolsonarista, publicamente defensora da atividade em territórios demarcados.
Essa combinação de crimes ligados ao garimpo, no entanto, provocou a maior tragédia humanitária deste século no Brasil que acomete os Yanomami. A Terra Indígena chegou a uma emergência sanitária, com crianças, adultos e idosos em condições dramáticas de saúde, vitimados por doenças como malária e pneumonia, desnutrição e contaminação por mercúrio. A situação levou o novo governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) a decretar emergência em saúde pública no dia 20 de janeiro.
Representantes da AGU
O grupo também será integrado por representantes das principais unidades da AGU com atribuições relacionadas ao tema. Eles serão coordenados pela Procuradoria Nacional de Defesa do Clima e do Meio Ambiente.
Farão parte a Secretaria-Geral de Contencioso;Procuradoria-Geral Federal; Procuradoria-Geral da União; Consultoria Jurídica junto ao Ministério dos Povos Indígenas; Consultoria Jurídica junto ao Ministério da Justiça e da Segurança Pública; Consultoria Jurídica junto ao Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima; Consultoria Jurídica junto ao Ministério da Saúde; Procuradoria Federal Especializada junto ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis; Procuradoria Federal Especializada junto à Fundação Nacional dos Povos Indígenas; Procuradoria Federal Especializada junto ao Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade e Procuradoria Federal Especializada junto à Agência Nacional de Mineração.
Pressão pelo julgamento do Marco Temporal
A situação trágica dos Yanomami revelada em janeiro também fez aumentar a pressão para o STF retomar o julgamento do Recurso Extraordinário (RE) do Marco Temporal. O recurso é considerado fundamental para salvaguardar os direitos territoriais dos povos indígenas no Brasil. Segundo a tese do marco temporal, defendida por ruralistas, os indígenas só podem reivindicar terras onde estavam fisicamente presentes na data de promulgação da Constituição Federal. Ou seja, em 5 de outubro de 1988, o que é contestado pelos povos originários.
O processo chegou à Corte, mas teve o julgamento adiado diversas vezes até ser iniciado em 2021. Até agora, apenas os ministros Kassio Nunes Marques votou a favor do marco, e Edson Fachin contra. Em setembro do ano passado, ao assumir a presidência do STF, a ministra Rosa Weber prometeu a representantes de seis etnias pautar o processo antes de deixar o cargo, em outubro. Recentemente, segundo informações do UOL, a presidenta afirmou a interlocutores que o caso será tratado como prioridade na agenda deste ano e que o julgamento deve ser retomado ainda no primeiro semestre.
A expectativa dos povos indígenas é que o Supremo derrube a tese do marco temporal e que o julgamento seja brevemente pautado. A avaliação que os adiamentos causam insegurança jurídica e política para essa população.
foto:Marcelo Camargo/ABr
Fonte:RBA